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Barba Ensopada de Sangue, uma história enigmática

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Barba Ensopada de Sangue é o quinto livro do escritor gaúcho Daniel Galera. É um livro forte, bem escrito, com diálogos intensos e precisos. Tem uma prosa musical que ao ler lembrei-me bastante da escrita do autor, também gaúcho, João Gilberto Noll. Eu tinha em mente iniciar o texto a partir do prólogo, mas prefiro deixar, por assim dizer, o início para o fim…

Daniel Galera autografa no lançamento do livro Barba Ensopada de Sangue.
Daniel autografa no lançamento de seu quinto livro. Foto: Reprodução

A trama é situada na pequena Garopaba, que fica no litoral sul de Santa Catarina, e conta a história de um professor de educação física que tem um problema neurológico que o impede de gravar a fisionomia das pessoas e a sua própria. Porém, antes dele iniciar sua jornada na pequena vila de pescadores ele tem uma conversa reveladora e dramática com o pai. Seu pai decide suicidar-se e pede a ajuda do filho para realizar tal loucura. Ele pede duas coisas: a) para o filho sacrificar sua cadelinha, Beta, que acabará ao longo do livro tornando-se uma das personagens principais; b) que o filho tente descobrir o que de fato aconteceu com seu avô, que foi assassinado em Garopaba nos anos 60. É lógico que o filho se recusa a aceitar que o pai faça tal atrocidade, isso a princípio. Mas o velho suicida consegue convencer o filho, e dentre os motivos usados por ele um me chamou atenção, e com isso caí numa profunda reflexão sobre o que é a vida.

Ao chegar a Garopaba, ele passa por um turbilhão de acontecimentos. Se relaciona com Dália, uma jovem e bela garçonete. Conhece um homem chamado Bonobo, budista e dono de uma pousada. E também, ao terminar com Dália inicia um novo relacionamento com Jasmine, uma jovem que está em Garopaba fazendo pesquisas para um trabalho de faculdade.

Quando começa a investigar a morte do avô Gaudério, ele nota que ao dizer o nome do avô às pessoas se recusam a falar sobre o assunto. Umas até o aconselham a parar de perguntar sobre tal coisa. No decorrer do tempo, ele começa a ver que o avô era como um mito para as pessoas daquela cidade. Que há histórias, “as grandes façanhas do velho Gaudério”, que ele passava vários minutos debaixo d’água para pescar garoupas, e muitas outras coisas exageradas, difíceis de acreditar. E chega um dado momento que o professor começa a se sentir ameaçado e resolve parar sua investigação.

A uma peculiaridade, o personagem não tem nome (outro fato que me lembrou os personagens do João Gilberto Noll). O “Nadador” como gosto de chamá-lo, anda pela cidade, nada no mar, e dá aulas de natação numa academia, sempre acompanhado da cadela que foi de seu pai. E como dito no primeiro parágrafo, no decorrer da trama, a cadela Beta torna-se uma das personagens principais. Ele está à procura de respostas que preencham as lacunas em sua vida, e dado a tantas perguntas sai numa jornada pelos picos de Garopaba. Ele não sabe o que vai encontrar, ou se vai encontrar algo de fato, e sua única companhia para realizar tal empreitada é a sua fiel companheira Beta.

O Fim, e enfim, o Prólogo

Autógrafo do Daniel Galera.
Autógrafo do Daniel, quando ele participou do “11º Festival Recifense de Literatura”. Foto: Elvis Souza

O livro tem toda uma segunda trama que gira em torno do protagonista, envolvendo a sua ex-mulher Viviane e o seu irmão Dante, mas que não é contada muito explicitamente. No decorrer do livro, Galera vai apenas dando dicas do que pode ter acontecido com a ex-mulher e o irmão, e só no último capítulo, juntamente com o prólogo é que se sabe o que ocorreu de fato.

O Título

Banner do livro Barba Ensopada de Sangue, de Daniel Galera.

Barba Ensopada de Sangue. Quem lê esse título pode achar que trata-se de uma história violenta, e isso acontece de fato. De início, o título do livro seria “Apneia”, conforme divulgado pela mídia literária. Mas quando foi publicado, viu-se Barba Ensopada… Li críticas bastante duras e negativas a respeito desse título. Eu particularmente gosto bastante, acho um título forte, robusto e marcante. Há uma cena do livro que o personagem faz um gesto quase que cinematográfico em sua barba que está ensopada de sangue. Achei a cena fantástica, genial, forte, intensa, onde se pode notar todo talento e técnica do escritor gaúcho.

A Capa

Capa do livro Barba Ensopada de Sangue, de Daniel Galera.
Capa do livro de Daniel Galera. Foto: Reprodução

Há três capas diferentes e muito bem feitas, nas cores azul, vermelha e verde. O Daniel falou que a escolha dessas capas foi uma jogada de marketing do pessoal da editora. A edição que tenho é a vermelha, mas é a azul que acho a mais bonita.

Tradução e Prêmios

O Barba Ensopada já foi traduzido na Alemanha, e lá ganhou o título de “Flut”, pela editora Suhrkamp. E tem direitos de edição vendidos para mais de dez países. Venceu o prêmio São Paulo de Literatura (2013), e faturou o 3º lugar no Prêmio Jabuti de Romance (2013).

Vale à pena embarcar no livro Barba Ensopada de Sangue?

Há muitas pessoas que o classificam como um épico. E falo sem demora que estou entre essas pessoas. Foi o melhor livro que li em 2013. Os personagens são todos criados de maneira riquíssima. A quantidade de detalhes é de impressionar, e a maneira como o Daniel controlou a questão do problema do personagem em reconhecer as fisionomias das pessoas foi extremamente bem feita. E ele fala que isso foi bastante difícil. A forma como ele impôs os diálogos, precisos e diretos, também me impressionou. No livro encontramos discussões sobre religião, budismo, a existência humana, etc. Isso tudo só faz enaltecer ainda mais o talento do escritor. É sem dúvidas um livro fantástico!